quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A Av. Paulista contra o trabalhador!

São Paulo livre dos ativistas?


O capitalismo criou uma indústria para lucrar com o homem fora do trabalho e controlá-lo; mas existem outros tipos de lógica repressiva, que tentam reprimir antecipadamente o que só de modo muito remoto põe em xeque o sistema. Por Douglas Anfra

«São poucos, porém são… Abrem sulcos escuros
no rosto mais fero e no lombo mais forte.
Serão talvez os potros de bárbaros átilas;
ou os arautos negros que nos manda a Morte.
[…]
Há golpes tão fortes na vida … Eu não sei!»
César Vallejo (poeta que dá nome à rua onde ocorreram os principais incidentes do despejo da favela Real Parque)

O Estadão chama a Paulista livre dos grevistas: advertência a todos os movimentos sociais

paulista-3O Estadão [designação corrente do jornal O Estado de S. Paulo] já pedia a “Paulista livre dos grevistas” no ano passado, pois, se o PSDB [Partido da Social-Democracia Brasileira, do antigo presidente Fernando Henrique Cardoso, cujo símbolo é o tucano] é deles e São Paulo é do PSDB, nada mais justo que a Avenida Paulista ser considerada dos tucanos do PIG (batizado pelo jornalista Paulo Henrique Amorim de Partido da Imprensa Golpista), e que possa ser um dia rebatizada de Avenida da Imprensa Golpista que, somada à Avenida Roberto Marinho, poderia ser uma segunda homenagem aos apoiadores da ditadura capitalista monopolista. (Veja aqui.)

E agora, finalmente, regozijam-se em seu editorial com uma punição que chamam de exemplar sofrida pela APEOESP [Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo] por causa de um ato com 10 mil pessoas em 5 de outubro de 2005. A multa inicialmente era de 156 mil, mas quando o sindicato recorreu, a multa subiu e desceu entre os juízes estabilizando em 1,6 milhão. Neste mesmo texto exemplar notamos o apelo do Estadão que reflete de todo o PIG:

“a decisão da 4ª Câmara de Direito Privado do TJSP deve servir de advertência a todos os movimentos sociais, organizações não-governamentais e entidades corporativas que insistem em bloquear ruas e avenidas importantes da cidade para realizar passeatas e atos de protesto, dificultando o tráfego e prejudicando a circulação dos paulistanos.” (Veja aqui.)

Podemos notar algo de mais profundo quando olhamos o conjunto desta manifestação de asco pelos que se insurgem em prol do direito da normalidade dos negócios da cidade. Prerrogativa dos que chamam a ordem pública para a anulação de direitos dos que se manifestam, onde sua ordem reflete não apenas o trânsito dos carros e a avidez por lucro segundo um tipo de espírito capitalista desumano, que defende o direito de ir e vir apenas do cidadão de automóvel. Neste sentido parece estar pressuposto um conjunto de modificações políticas que inviabilizem as diversas formas de associação, lazer público e protesto.

Sindicatos

paulista-2Tal modo de tentar quebrar um sindicato não é novidade, iniciou-se com Fernando Henrique Cardoso, que utilizou intervenção do exército nas refinarias no começo dos anos 90 para pôr fim à greve dos petroleiros. Enquanto fazia isto, iniciava o processo de privatização das refinarias, que posteriormente gerou a base financeira dos investidores brasileiros da bolsa que brincavam de banco imobiliário (como o PIG), enquanto entubavam o povo boliviano com o gasoduto e quebravam o monopólio estatal do petróleo que constava da constituição de 1988.

No final da greve, junto com o então ministro do TST, Almir Pazzianoto, aplicaram uma multa que destruiu a capacidade de mobilização de uma das maiores federações de sindicatos brasileiras. Golpe de mestre de um antigo estudioso de sociologia que estudou também os trabalhadores junto com Florestan:

“Foi o TST que declarou a greve ilegal — e que puniu os 21 sindicatos com uma multa de R$ 100 mil por cada dia dos 21 em que a decisão foi desrespeitada. Houve quem achasse que iria acabar em pizza — mas o fato é que a decisão está sendo cumprida à risca. Cada Sindipetro está devendo R$ 2,1 milhões — e a cobrança judicial, além de determinar o bloqueio das contribuições sindicais (R$ 80 mil mensais no caso de Cubatão) e das contas bancárias, ainda determinou a penhora de todos os bens. Os petroleiros lutaram, e continuam lutando, para livrar-se do pagamento da dívida — uma decisão que consideram política e que não reconhecem. No plano estritamente financeiro, para driblar o confisco, reduziram as contribuições sindicais descontadas em folha pela Petrobrás a simbólicos R$ 0,1. Passaram, então, a recolher os 3% de praxe no boca a boca nas portas das refinarias — e daí o “mendigando” de Averaldo. Não recolhem os R$ 80 mil, ouvem alguns desaforos, mas têm conseguido arrecadar entre R$ 50 mil e R$ 60 mil, o que permite pagar a folha dos 47 funcionários e dos 14 demitidos em conseqüência da greve.

No plano político, os petroleiros tentaram uma anistia via Congresso. Conseguiram a unanimidade da Câmara e a quase unanimidade no Senado — mas amargaram o veto implacável do presidente Fernando Henrique Cardoso. Têm como último recurso a derrubada desse veto via Congresso e o julgamento de um recurso extraordinário que impetraram junto ao Supremo Tribunal Federal. “É tudo que nos resta”, diz Averaldo, consciente de que os bens penhorados, incluindo a bela sede avaliada em quase R$ 2 milhões, podem realmente ir à praça, para serem vendidos em leilão.” (Veja aqui.)

Este caminho parece estar sendo seguido por seu amigo Serra, que foi presidente da UNE [União Nacional de Estudantes]. Tudo bem, sabemos que a UNE é o que é. Sabemos que uma das primeiras medidas do Serra quando presidente dela foi acabar com o alojamento para militantes em encontros na sede da UNE do Rio (esquerda mesmo, ele nunca foi, nem quando era da Ação Popular). Mas ele sabe o que é Movimento Estudantil, foi cassado e fugiu para o Chile, viu a destruição da Frente Popular que o hospedou e fugiu outra vez para a França, e hoje ajuda a desmobilizar estudantes e a classe trabalhadora. Após aprender a lição de Pinochet, seu ataque agora é contra a APEOESP [Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo] e o sindicato dos Trabalhadores da USP [Universidade de São Paulo] com pesadas multas e perseguição política.

Um grande sindicato como a APEOESP, mesmo recuadinho na direção, ainda tem capacidade de mobilização e militantes de base tão bons e imaginativos como o prof. Tonhão, demitido e abandonado pela entidade, mas que deixou seu exemplo e um grande número de associados, por isso, este sindicato ainda apresenta uma possibilidade de movimento que deve ser reprimida.

Junto com esta carga violenta vem o “interdito proibitório”, recurso jurídico do direito civil utilíssimo aos patrões exploradores, afinal, que coisa pode ser melhor que um mandato de reintegração de posse preventivo, isto é, sem que se tenha tomado posse ou existido qualquer indício material de ameaça? Este recurso serve para combater o sindicato antes de qualquer ação que ele faça, pois presume graciosamente que este possa vir a agir de modo radical, a ocupar, a mudar o sentido do uso político de um bem determinado privado ou público, comparando qualquer serviço ao serviço privado bancário.

Esta jurisprudência, que só muito forçosamente pode ser aplicada a outros contextos, é outra das grandes ameaças aos sindicatos de hoje, que faz os escritores do editorial dos jornais e seus amigos dormirem cada vez mais felizes e tranqüilos, pois os protege inclusive contra seus próprios funcionários ao pressupor que estes possam vir a agir algum dia. A ordem está garantida aos patrões e as únicas greves serão de pijama. Mas, do modo como a coisa anda, tais questões não poderão ser discutidas nos bares ou mesmo em casa de pijamas.
(artigo integral em passapalavra.info)

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