quarta-feira, 8 de julho de 2009

Tonhão foi um dos expulsos da rede pública de ensino do estado de São Paulo

Fonte: http://passapalavra.info/?p=7955


onhão foi um dos expulsos da rede pública de ensino do estado de São Paulo por ter participado da greve com ocupação que os professores organizaram em torno da Secretaria de Educação, em 2000. Nesta entrevista, ele comenta sobre este processo de luta e aponta brevemente suas impressões sobre os descaminhos do sindicalismo no Brasil.

Conversar com o professor Tonhão é estar diante de alguém que participou ativamente dos principais processos políticos do país, sobretudo no que diz respeito aos altos e baixos que teve a atividade sindical desde os fins da década de 1970. Ele esteve na fundação da CUT e do Partido dos Trabalhadores (PT), quando estes eram ainda tidos como organizações ultra-radicais até pelos militantes de horizontes mais revolucionários.

tonhao1Nascido em 1947, Antônio Justino se tornou figura de destaque entre os professores da rede pública de ensino do estado de São Paulo. Sempre optando pelas ações de base, ele foi um dos protagonistas da greve com acampamento que a categoria organizou em torno da Secretaria de Educação, em 2000; a última grande mobilização do setor. Esta forma de luta radical resultou na sua exoneração e na de mais três colegas de profissão. E, até hoje, 35 professores podem ser demitidos por conta de um processo criminal que os acusa de terem falsamente testemunhado em defesa de seus pares.

Como professor, formou-se em Cajurú [município do interior de São Paulo] e iniciou sua militância política e o exercício do magistério em 1968, na região do Pontal do Paranapanema-SP. Já nesta época, após um ano de perseguição por parte dos grandes fazendeiros, que por lá sempre foram a autoridade suprema, ele veio para São Paulo, onde construiria uma trajetória vigorosa no interior do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP).

Mesmo com todo este histórico de perseguição, ao contrário do que se poderia supor, Tonhão se mantém firme com suas convicções socialistas: continua defendendo a ação direta e não poupa ataques às direções sindicais, que para ele devem ser consideradas como inimigas de classe dos trabalhadores. Atualmente, apesar de não atuar mais pelo sindicato, o professor mantém o Comitê de Apoio aos Povos em Luta com o dinheiro que arrecada com a venda de DVDs (de onde sai também sua própria renda). A idéia é disponibilizar fundos às entidades e iniciativas de luta que estão em curso.

Nesta entrevista concedida ao Passa Palavra, no dia 14 de junho, em plena assembléia regional da Apeoesp, ele faz a sua leitura a respeito do ciclo da mobilização de 2000 e ainda aponta brevemente suas impressões sobre os descaminhos do sindicalismo no Brasil. Passa Palavra

Passa Palavra: Professor, como foi o começo da sua militância na APEOESP?

Tonhão: Minha militância na APEOESP começou na década de 1970. A APEOESP na realidade era um escritório jurídico. Tinha um cara [fulano], um tal de Raul Schwinden [hoje, este advogado mantém um escritório de consultoria jurídica para causas trabalhistas] que dirigia este departamento e, em 1979, nós participamos juntos de uma chapa [lista] de oposição. Foi muito interessante porque uma parcela daquele pessoal está na APEOESP hoje, com uma política totalmente integrada à da Articulação [corrente interna do Partido dos Trabalhadores]. Mesmo a oposição que existe atualmente neste sindicato não pode nem ser chamada de light. Ela é extremamente oportunista em usar a proporcionalidade para poder se favorecer por dentro da instituição. É cara que se contenta com celularzinho [telemóvel] pendurado, ticket refeição, carrinho para andar pra lá e pra cá e esses passeiozinhos que os sindicatos costumam fazer.

Já a minha militância política começou no PT, em Diadema. E é aí que está o nó da questão! – porque eu nunca fui um militante corporativo, eu sempre entendi a luta de uma forma ampla. Por conta da formação marxista que eu sempre tive, essa coisa da totalidade, para mim, sempre foi fundamental. Então, as pessoas me confundiam na APEOESP, achavam que eu era metalúrgico, me pediam holerite [folha de pagamento do salário]…

A grande mobilização de 2000
A grande mobilização de 2000

Uma vez, teve uma assembléia no Morumbi com 100 mil professores. Eu fiz uma defesa da continuidade da greve - que já estava expirando, com a língua pra fora – e a gente conseguiu estender um pouco mais a greve. Quando eu desci do caminhão [de som] tinha um monte de gente me pedindo holerite, para saber quem eu era, se eu era metalúrgico, se eu era professor [risos].

PP: A greve de 2000 é tida por você como um marco na mobilização desta categoria? Como foi construído este movimento?

T: Aquele movimento é um marco. Porque de lá pra cá não aconteceu mais nada. O governo se utilizou da perseguição a alguns militantes – como está fazendo com o Brandão lá na USP – para poder calar o conjunto. E, com esse sindicato que foi conivente com a nossa demissão, o governo tem todas as condições para impor o projeto que ele tem desde 1994 para a educação e fazer uma varredura. Aliás, já fizeram.

Hoje, quem fala que é oposição na APEOESP acaba levando sua militância para a desilusão. Quando a própria corrente que é considerada radical vota “estado de greve”, junto com a Articulação, o que ela acaba fazendo? Põe a sua própria militância em parafuso [desorientada]. Não existe mais uma disjuntiva na APEOESP.

Eu acho que, do ponto de vista sindical, o neoliberalismo cumpriu sua tarefa: levou todo mundo numa grande onda. Por outro lado, essa via parlamentar, como a eleição de Lula, Chavéz, Morales, abriu a perspectiva de que poderia surgir algo de novo. Nada disso aconteceu.

PP: Como foi o processo, na greve de 2000, que culminou na sua demissão e na de mais três companheiros?

T: Em 2000, a gente dirigiu a greve. Os caras [do sindicato] vinham com estes pacotes burocráticos de negociação, mas chegavam no caminhão [de som] e encontravam a gente. E lá, a gente ia mesmo dialogar com a massa: 40 mil, 50 mil votavam com a gente. Isso foi um marco! Depois que a gente aprovou o acampamento, ele acabou se tornando o Quartel General da greve; os professores só iam tomar banho, tomar café na APEOESP, que ficou sendo um sindicato-hotel [risos]. Mas o movimento vivo estava no acampamento da Praça da República. Tanto que, quando o Covas [então governador do estado de São Paulo] esteve presente lá, ele disse: “Como vocês podem deixar 5% dos radicais dirigir o movimento?” Não é que o sindicato não podia deixar, o problema era que o nosso trabalho na categoria era antigo, enraizado. Nós tínhamos trabalho de base: na escola, na região. Quando a gente falava em educação, mobilizava a molecada [miudagem] da escola, ia pra frente da Secretaria de Educação e “quebrava tudo”.

PP: E já naquele mesmo ano foram anunciadas as demissões?

"Aquele movimento é um marco. Porque de lá pra cá não aconteceu mais nada."
“Aquele movimento é um marco. Porque de lá pra cá não aconteceu mais nada.”

T: Sim, essas demissões já estavam engatilhadas. Eu tenho uma história de muita perseguição na APEOESP. Além dos sete processos criminais que o Roberto Felício [Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (1989 a 1993) e da APEOESP por duas gestões (de 1993 a 1999), hoje é Deputado Estadual pelo PT em São Paulo] abriu contra mim, juntava a repressão da época da ditadura. Por exemplo, aqui na APEOESP, poucos sabem que o único professor que esteve no DOPS [Departamento de Ordem Política e Social – principal órgão de repressão e tortura do regime militar] fui eu. Dessa história se perdeu tudo, não existe memória na APEOESP. O pessoal da oposição que olha nos arquivos diz que não encontra nada. Acabaram com tudo, com toda memória, entendeu? E isso tem a ver com a disponibilidade que o sindicato passou a ter com o aparato burguês. A APEOESP trabalhou muito em cima desse negócio de PT. Eu era da CUT antes de ela se filiar, eles a achavam muito radical [risos].

PP: E como você enxerga hoje a experiência da Conlutas [Coordenação Nacional de Lutas]?

T: Eu acho que a Conlutas perdeu uma grande oportunidade de se tornar uma organização de luta na greve da GM agora. Em vez de organizar uma forma de luta direta, ficou fazendo abaixo-assinado para ser criada uma MP [Medida Provisória] em que o Lula garantisse a estabilidade destes trabalhadores. E o pior é que para eles, trabalhador só é o cara de fábrica. Eles entendem que o sujeito do processo revolucionário ainda é o cara da fábrica, sujo de graxa, de macacão. Isso acabou. Hoje o sujeito do processo revolucionário é algo que a gente não sabe o que é mais. Esses movimentos atuais antiglobalização são movimentos que têm muito mais elementos de luta direta que o sindicato, que não consegue organizar este tipo de coisa. Em 1979, o Lula dizia: “trabalhador é trabalhador, metalúrgico é metalúrgico, estudante é estudante”. Depois é que eles foram se ajeitando e encontrando um sentido de classe. E hoje, quem é a classe? Quem são os proletários do mundo todo? Quem são os proletários na China, na Índia, no Brasil, na América Latina? Então… é um sindicalismo economicista, corporativista, legalista…

Socialismo ou barbárie? Com estas direções que aí estão? O Trotsky tinha razão ao fazer a crítica às direções, existe um problema de direção. Como é que o Sintusp [Sindicato dos Trabalhadores da Universidade de São Paulo], que tem 4 mil sócios, faz um puta de um barulho [um enorme barulho] desses e a APEOESP, com 130 mil sócios, não faz nada? Hoje a APEOESP não faz nem a defesa jurídica dos associados, quanto mais a defesa política!

PP: Qual foi a acusação legal que acarretou as exonerações?

T: Eles disseram que nós impedimos a entrada do governador na Secretaria de Educação. Quer dizer, isto foi o mote. Mas tem coisa no meio.

PP: Você não acha que aquela atitude do Covas foi premeditada?

O finado Covas desafiava os grevistas

O finado Covas desafiava os grevistas

T: Eu acho que foi e com a conivência da APEOESP. Porque cinco minutos depois do acontecido a diretoria do sindicato estava todinha no acampamento, e ela não ia lá; quem estava no acampamento era refratário a eles. Não ia ninguém, não iam deputados, até porque se fosse deputado nós íamos jogar ovo nele [risos]. Negócio [coisa] de Suplicy, Ivan Valente? Nada disso: “nós não queremos filho da puta nenhum aqui”. Quando deu cinco minutos eles estavam todos lá, a diretoria estava todinha ali. Inclusive, eles deram cobertura para o Covas sair dali.

PP: Os processos que se seguiram foram apenas no âmbito administrativo ou também no criminal?

T: Administrativo e criminal; no criminal nós ganhamos.

PP: E isto não fez reverter a decisão administrativa?

T: Não, porque os processos são desmembrados: o criminal não teve nada a ver com o administrativo. Agora, no caso dos 35 [os outros professores que testemunharam a favor de seus colegas e até hoje são indiciados por falso testemunho] não é desmembrado. Olha como são as coisas! Os 35 professores perseguidos foram acusados de falso testemunho porque disseram o seguinte: “Ninguém impediu o Mário Covas.” Aí retrucaram: “Mas se não impediram, por que tinham aquelas cadeiras, aquelas barracas?” Ou seja, foram acusados por falarem que ninguém foi impedido. Então assim, eu acho que foi um negócio [uma coisa] muito bem montado, que na época nós não sacamos [percebemos] e caímos. Por sorte eu não fui pego naquele dia, se não eu estava fudido. Os outros três foram presos. Eles eram meninos e não eram os mais radicais na greve. Um deles, o Claudinho, deu toda a proteção para o Covas sair da Secretaria, e, inclusive, a posição política dele era de não se chocar com o Estado em hipótese alguma. Mas os meninos foram presos na rua, sem terem nada a ver com a confusão daquele dia.

PP: E qual foi o impacto deste episódio para estes jovens militantes?

T: Imagina só, militância nova, chegaram a pegar cana [ser preso], cana brava [prisão temível]! No distrito não, mas a abordagem policial foi muito agressiva com eles. Um deles era soropositivo [seropositivo], ele largou dos coquetéis que estava tomando, largou dos remédios, largou de tudo; depois de pouco tempo faleceu. Imagina! O outro menino, o Marcos, de Mirassol, está com rim policístico. Rapaz, se você visse o estado dele, você não ia acreditar, ele está desfigurado, camarada. E a APEOESP paga uma ajuda de custo para ele, não é o salário integral. E uma pergunta que a gente faz pelos comunicados que lançamos por aí: se estes 35 forem demitidos, quem vai pagar o salário deles, e quanto vai pagar? Porque se depender da ajuda de custo o cara não vive.

PP: Hoje, estes exonerados têm algum vínculo financeiro com a APEOESP?

T: Sim, os três aceitaram. Eu não aceitei para não ser conivente com a demissão. Na época eu usei até um termo: “não vou usar dinheiro da máfia”. E outra, tem uma coisa muito clara para mim: estes caras [a diretoria do sindicato] são inimigos de classe. Eu disse: “Eu trato vocês como inimigos, me respeitem e me tratem também como inimigo”. E inimigo se trata no pau, não tem essa de ficar de conversinha pra cá, conversinha pra lá.

"E hoje, quem é a classe? Quem são os proletários do mundo todo?"
“E hoje, quem é a classe? Quem são os proletários do mundo todo?”

Você imaginaria que o sindicato iria virar isso aqui, agora? Está aplicando no mercado financeiro! O sindicato é sócio de companhia de aviação! Não tem mais essa de luta de classes. Isso aqui é uma pequena-burguesia que vem para estas reuniões e montam aquelas passeatas [manifestações] que parecem mais um velório; só faltam as velinhas na mão. Não tem uma faixa, não tem uma palavra de ordem, não tem nada, é uma romaria.

PP: Você mantém contato com os outros exonerados, há algum tipo de solidariedade entre vocês?

T: Mantemos. Inclusive o Marcos esteve na minha casa, faz um mês mais ou menos. Ele estava ótimo. Aí foi coisa de 15 dias eu o vi, ele estava totalmente desfigurado, acho que deram remédio errado para ele. O cara está inchado dos pés à cabeça. O Claudinho foi o único professor que conseguiu voltar a dar aula, porque nós prestávamos concurso e não entrávamos. Eu prestei concurso na prefeitura, quando a Marta Suplicy [do PT] era prefeita [presidente da câmara de São Paulo] e ela me barrou. E não foi por falta de movimento. Fomos com nove ônibus lotado de gente à frente da porta da prefeitura, mas quem nos atendeu foi a guarda municipal. Então, eu mantenho contato com eles, a gente se comunica, mantemos o respeito e a solidariedade. Esses dias perguntei ao Marcos: “Esses 700 reais que você ganha da APEOESP dá, pelo menos, para comprar remédio?” Ele respondeu que sim, então tudo bem.

PP: E qual foi a posição que a base do sindicato, de uma forma geral, tomou em relação às demissões?

T: Olha, não teve uma sub-sede que soltou uma matéria denunciando o caso do jeito que vocês estão fazendo [o professor se refere e aponta para versão impressa do Passa Palavra para a grande São Paulo, que traz na capa o artigo «A APEOESP e os exonerados na greve de 2000»]. Aí, agora, eles [a ala de oposição do sindicato] ficaram sabendo que eu estava com câncer [cancro] e vieram me oferecer uma ajuda. Eu disse: “Rapaz, me respeita, eu não sou doente, eu sou militante, e militante não fica doente nunca.” Eles vêm com essa de tratar a gente, mas é para rebaixar a discussão, entendeu? É esse o tratamento da oposição. Não sabia que estes trotskistas eram cristãos [risos], vêm com esse negócio de caridade. Não quero caridade, não.

PP: Mas, na época, foi criado um Comitê de Solidariedade aos Processados, não foi?

T: Foi, e chegou a ter 200 pessoas da base do acampamento envolvidas neste Comitê. Mas foi minando aos poucos: corrente [política] de cá, corrente de lá, muita corrente, acabou implodindo. No fim, a gente era os ultra-esquerdistas.

PP: E oficialmente, o sindicato não apoiou em nada?

"...eu acho que foi um negócio muito bem montado, que na época nós não sacamos e caímos."
“…eu acho que foi um negócio muito bem montado, que na época nós não sacamos e caímos.”

T: Hum! Uma materiazinha de jornal, mas nunca teve uma campanha firme, como está fazendo o Sintusp, tirar [organizar] uma greve porque foi demitido o Brandão. Isso nem passa pela cabeça da APEOESP. O negócio [coisa] foi o seguinte: quando teve a abertura dos processos contra nós, a procuradora-geral de justiça do Estado, da tal Comissão Processual, atuava dentro da Secretaria de Educação. O que você vai esperar de um negócio desses, qual a isenção disso aí? Um dia depois do Mário Covas ter passado lá no acampamento, a mulher foi lá na garoa [chuva], eu achei que ela era funcionária da Secretaria e perguntei:
- Escuta, você é funcionária?
- Não, não, eu sou a juíza que vai analisar…
- Ah! Você é uma vira-lata subserviente. Vai vir aqui debaixo dessa chuva, você está fazendo papel de serviçal, porra?

Já fui pra cima dela [risos]. Daí nós procuramos achar um advogado que abrisse o processo. Porque se fosse esses picaretas [trapaceiros] aí – Márcio Thomaz Bastos, Greenhalgh -, eles não abrem o processo. Aliás, não vêem nem a cara do cliente, eles mandam o escritório resolver a parada. O nosso advogado recebeu 70 mil reais, mas a condição era essa: “Você abre o processo pra gente, tudo que acontecer lá você vai nos passar.” Mas o cara era muito novato. Se não é na política, você não resolve este tipo de coisa. Juridicamente, é tudo dos caras [da parte de acusação].

PP: E quanto aos 35, tem algo sendo feito?

T: Nós estamos perguntando para eles por que eles não aparecem nas reuniões. Será que é o silêncio deles que vai garantir o pagamento em caso de demissão? Há uma dificuldade de reuni-los, nós estamos tentando reunir pelo menos dez; ainda estamos em oito. Qual que é? É uma troca que eles querem fazer, dinheiro pelo silêncio? Para mim é isso, não é outra coisa. Nunca se abriu uma discussão política para entender o significado destas demissões. Toda solidariedade que acontecer e não discutir o significado político disso é uma solidariedade burguesa. Na APEOESP não existe essa de ser solidário porque a justiça está atrás da gente. É um silêncio total, nunca se falou de nada, nem aqui nem nas subsedes.

PP: No caso de vocês houve algum apoio de outros setores da esquerda?

T: Isolamento total, total. Poucos sindicatos deram apoio: o Sintusp e um ou outro mais à esquerda. A APEOESP tem 90 subsedes, a oposição dirige umas 30 ou 40, se quisessem, dava pra fazer um barulho.

PP: Você não acha que faltou aliança com outros movimentos para que tivessem uma maior sustentação? Por exemplo, não seria essencial que os trabalhadores da rede pública de ensino superior atuem em conjunto, não falta uma aproximação maior entre estes dois setores?

T: Olha, entre a ADUSP [Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo] e o SINTUSP tem uma distância enorme. A ADUSP só está entrando na greve agora [a entrevista era realizada no dia 14/06, cinco dias após a tropa de choque invadir a cidade universitária] por causa da polícia, não é por causa de salário,

"Para eles o Brandão é maluco!"
“Para eles o Brandão é maluco!”

nem de Brandão. Eles querem é ficar longe do Brandão. Para eles o Brandão é maluco! Infelizmente, os sindicatos ligados à educação não defendem a educação, eles defendem dinheiro e mantêm uma atuação totalmente corporativista. Antigamente a gente tinha trabalho [de base] na escola, preparava a molecada. Discutia, deliberava, pintava uma faixa na escola, saía de lá com a molecada com a autorização dos pais e ia para a Secretaria de Educação, com pau, porrete… [risos]. É isso que eu falo para o pessoal: “Quer ser sindicalista? Vai ser primeiro professor.” Tem que dar aula, não deixar de entregar as coisas em dia e ser um excelente profissional. Pelo menos organiza os moleques na escola, organiza um conselho de escola, algum organismo que tenha um caráter político. Mas os professores estão muito distantes disto, querem mais é ganhar dinheiro para sobreviver. Por exemplo, a maioria aqui tem os filhos em escola paga, apesar de dar aula nas públicas. Eles são estranhos à luta por uma educação de classe.

Na minha demissão, os caras me pegaram na rua. A secretária de Educação ligava na escola e pedia um fax para saber se eu estava assinando o ponto, mas nunca me pegou, porque eu era um profissional.

PP: E hoje, qual o balanço que você faz do processo todo. Não considera que o grupo do acampamento foi muito radical e ficou isolado diante da categoria?

T: O problema do isolamento foi imposto, porque apoio tinha. Tinham noites que reuniam mil pessoas na Praça da República, entendeu? Setores anarquistas, setores marxistas, aposentados, gente de sindicato e cara que ia lá prestar solidariedade. O problema é que era na contramão de uma direção sindical. Na APEOESP, o método da luta direta é totalmente descartado. O método deles é o seguinte, uma dobradinha: eleger Bebel [atual presidenta do sindicato] para estadual [deputado estadual] e Robertão [atual presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação] para federal [deputado federal] [risos]. Com certeza! O quadro da APEOESP, hoje, está muito rebaixado, tem gente que não sabe fazer uma análise de conjuntura. Os bons, entre aspas, já estão todos no governo federal, ou com cargos ganhando acima de 5 mil reais. Então, nós fomos ultra-radicais? Acho que não.

PP: Tonhão, você acompanhou o levante social em Oaxaca, no México, em 2006? Como você recebeu este movimento que teve o professorado como um dos seus principais protagonistas?

T: Eu ia pra Oaxaca em janeiro daquele ano, mas em dezembro apareceu este tumor em mim. Eu acho que são estes movimentos que estão vivos, e você tem que ser vivo. Não se faz história se não for com o presente. O pessoal aqui hoje não faz nada. Por exemplo, podia pegar uma comissão aqui, ir lá na USP, chamar a unidade, fazer um ato junto, criar um fundo de greve ativo. Tem que ter um esforço pra reorganizar a luta.

PP: Professor, por último, gostaríamos de agradecer sua atenção e deixar um espaço para que acrescente algo (se quiser) antes de finalizarmos a entrevista.

T: Eu gostaria de parabenizar a iniciativa de vocês. A solidariedade de classe é que permite algum tipo de organização séria. Enquanto estiver discutindo com os camaradas - seja anarquista, seja marxista, seja maoísta, seja trotskista, seja cristão, seja o diabo que for - a questão da solidariedade, a gente considera uma luta justa. Além do mais, é uma luta democrática, não tem nada de ultra-esquerda. Então, gostaria de falar da satisfação que me dá em saber que iniciativas e organizações como a de vocês ainda existem. E eu acho isso brilhante!

Um comentário:

Marta Bellini disse...

Que entrevista bacana!